Acidente manual

Nunca dois pares de mãos foram tão feitos pra se encaixar

Era uma acidente estatístico

De tantas conformações e formatos de mãos

Aqueles dois encaixes existiam no mesmo mundo, no mesmo tempo.

Não só os dedos que se encontravam sem esforço

As palmas compartilhavam segredos

Os segredos se juntavam em um só

Um segredo enorme, impossível de existir em partes separadas.

Uma mão que reconhecia a outra

Um espetáculo universalmente íntimo,

Descomunal e particular

Visceralmente convergente

Desimportante para a plateia que não podia ver.

Nenhuma das mãos era dela.

Incapaz de entender que ali existia a explosão de um sol,

uma bomba atômica, uma paz profunda,

um nirvana, todas as estações do ano,

um amalgama, uma fusão contraditória,

um paradoxo real

E nunca uma se separava da outra,

mesmo em distâncias temporárias e insuportáveis ,

eram mãos raras, independentes, funcionais,

que esbarravam com milhares de outras mãos e braços,

mas que tinham na memória o toque do seu par.

Um par inevitável, maravilhosamente impossível

Amorosamente paradoxal.