Previsão do tempo

Quando eu era menino não tinha medo de chuva. Porque a chuva era só água caindo do céu. Quando fiquei mais velho, adolescente, comecei a aprender a evitar a chuva. Descobri que ela molha e deixa a gente ensopado, incômodo; as meias encharcam, as roupas pesam, faz tudo andar devagar. Aprendi a evitar poças, degraus, rampas, subidas e descidas. Desagradável, desconfortável. Passei anos fazendo careta quando via uma nuvem carregada, o céu cinza, o barulho de trovão. Mas, se eu precisasse sair pra rua pegava um guarda-chuva e arriscava uma barra de calça molhada.

Já adulto, acostumado às desgraças climáticas me vi preso no meio de uma tempestade terrível, que caiu em mim como se um deus provocador furasse um balão d’água bem em cima da minha cabeça. O vento arrebentou o pano do guarda-chuva e arrebatou da minha mão o que sobrou daquela coisinha patética, metal e pano voando tão rápido. Por um tempo quase que esqueci da tempestade, olhando atordoado. Parecia um urubu, todo asas desconjuntadas, arremessado pro céu pelo mesmo deus caprichoso. Agora, momentaneamente seco, eu vejo que a minha própria desconjuntura tinha vindo da fúria com que a tempestade arrancou o guarda-chuva da minha mão, que ficou segurando um cabo invisível. Com meu olhar embaralhado e a boca aberta eu era um espantalho patético que não espantalhava nada. Foi só quando a massa d’água molhou meu queixo, eu me percebi catatônico na enchente. Quase demorei demais pra começar a nadar, embruxado pela perda de um guarda-chuva.

Não quis sair mais pra chuva depois da tragédia. Imagine o risco de sair de casa. A lembrança de uma meia molhada já não era só de uma meia molhada, era a memória de pés batendo desgraçadamente sem sapatos, sem meias, nus e expostos ao cataclismo.

Mas quando eu era menino não tinha medo de chuva. E nem toda chuva é tempestade. Aprendi a prever o clima com mais precisão, sem instrumento, nem nada. Só olhando e sentindo a direção do vento. Não saio mais na rua em tempestades e não acho que ninguém deva sair.

Não, não... Quando eu era menino não tinha medo de chuva. E eu era mais esperto. O menino e eu sentamos pra conversar e ele me disse que é chato ficar em casa desejando que nunca mais chova. “Sempre vai chover!” ele me disse. Eu já tinha vivido mais do que ele e sabia que era bem verdade. Sempre vai chover. Ele me ensinou que se eu tomasse chuva era só secar a roupa molhada, tomar um banho quente, colocar outra roupa e seguir brincando até se molhar de novo na próxima. Ele era realmente mais esperto do que eu. A meia sempre vai dar uma encharcada, a barra da calça vai ficar mais pesada até o meio da canela.

No dia seguinte eu comprei um guarda-chuva novo porque quando eu era menino não tinha medo de chuva.